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Adolfo Pérez Esquivel, ativista dos direitos humanos: ‘Nenhum exército tem capacidade de garantir a paz

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Só no Brasil fui preso duas vezes, por lutar contra a ditadura e para que se respeitasse a vida. Por isso, não consigo conceber que tratem o militarismo como instrumento de paz. Se perdermos a capacidade de lutar pela vida, teremos fracassado e renunciado ao nosso direito.”

Conte algo que não sei.

Nenhum exército tem a capacidade de garantir a paz, já que ele nasceu para o combate. No caso da violência que assola o Rio e o Brasil, tentar resolvê-la com a militarização atenta contra a democracia. A igualdade de direito para todos, lamentavelmente, não está acontecendo nem aqui no Brasil nem no resto da América Latina. A solução para a barbárie deve acontecer por outros meios, como o diálogo.

A situação da Síria não parece que será resolvida por meio de diálogo. Qual a sua análise sobre o assunto?

O bombardeio ordenado por Estados Unidos, França e Reino Unido é um crime contra a Humanidade. Trump não defende a democracia nem a liberdade. Luta pelos seus interesses. Por trás de tudo estão o complexo industrial militar, os interesses geopolíticos na região para o controle do petróleo. E vêm daí também os ataques à Venezuela. As guerras são planos estratégicos das grandes potências. São hipócritas que falam sobre a liberdade.

O Papa Francisco, que é argentino como o senhor, tornou-se a principal figura na defesa dos direitos humanos no mundo. Como o senhor vê a atuação dele?

O Papa Francisco está chamando a consciência internacional para a necessidade de pararmos as guerras e cuidarmos dos refugiados, além de olharmos para os problemas que causaram milhares de mortes no Mar Mediterrâneo. Em dezembro, ele organizou uma grande reunião para tratar do desarmamento nuclear. Eu me reúno com ele sempre que vou a Roma. A última vez foi em dezembro. A espiritualidade e a religião têm a ver com a vida, não podem ser alheias aos acontecimentos.

A Igreja e o mundo estavam carentes de personalidades como ele?

Sim, claro. Necessitamos de gente que tenha uma visão social e política no sentido do bem comum. O Papa é um homem com uma visão assim. Como Dalai Lama, de quem também sou muito amigo. Os líderes espirituais são necessários em momentos como este, de crises de valores e de sentidos da vida.

As pautas identitárias ganham cada vez mais evidência e visibilidade. Isso quer dizer que a discussão sobre os direitos humanos está se redesenhando?

As identidades são parte dos direitos humanos, que não olham apenas para o cárcere, a tortura e o desaparecimento de pessoas. Os direitos humanos têm a ver com as identidades, a diversidade e o pluralismo cultural, e também com o meio ambiente. As causas humanas são valores que não podem ser separados das democracias. Colocar o voto numa urna não significa que se está numa democracia. É um exercício apenas. A democracia é mais profunda, dignifica os direitos, sejam eles dos negros, dos marginalizados, dos empobrecidos. Todos somos distintos. Homens, mulheres, gêneros. Todos temos os mesmos direitos.

Os criminosos também?

Claro. Eles têm que ser tratados humanitariamente. Se precisam reparar um erro diante da sociedade, devem fazê-lo de acordo com a sentença. Na Argentina, trabalhamos muito monitorando os cárceres para que não torturem ou maltratem.

Além da visita que fez ao ex-presidente Lula, o senhor está no país para dar palestras, a convite da UFRJ. Qual é o papel das universidades públicas na luta pelos direitos humanos?

É fundamental. Elas são a base da consciência crítica de valores e devem ser abertas ao povo. Precisam de uma estrutura autônoma a qualquer governo, para evitar as intervenções políticas. Dentro delas, há política. Os estudantes da Argentina têm alto grau de compromisso político.

O senhor prestou homenagens à vereadora Marielle Franco e ao motorista Anderson Gomes. A morte deles assusta quem faz militância?

Se nós nos basearmos no medo, ficamos paralisados. Não podemos parar. A única forma de construir é a contribuição.

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